Organizados em um círculo de diâmetro 7, os senhores
grisalhos se entreolhavam. Munidos
com seus potentes óculos de aro redondo, réguas de precisão milimétrica e
balanças super sensíveis, não sabiam por onde começar o exame do misterioso fenômeno.
“É preciso explicar as causas elementares disto.” Decretou o líder, de semblante fechado e dentes amarelos.
“Sim, mestre. Mas não há como catalogar todas as situações
típico-ideais em que o fenômeno eclode. A sua origem é indeterminada. Parece
que estamos lidando com um objeto a-histórico, extra-linguístico e, acreditem, ilógico.”
Retrucou o ousadíssimo estudante.
“Homem de pouca fé no conhecimento!” Bradou outro. “Trata-se
claramente de uma invenção do século XIX, marcada pela combinação entre Sistema Capitalista, Urbanização Pós-Revolução Industrial e Cristianismo.”
Costas arqueadas e pontas dos dedos no queixo, o chefe
soltou um muxoxo: “Grande bobagem. Obviamente não estamos lidando com o Romantismo pálido que tanto inspirou jovens sem juízo. Isto aqui não inclui
glamourização do suicídio, onipresença da primeira pessoa do singular ou idealização da
figura feminina.” E voltou a se recolher em sua caixa craniana.
Desconsiderada a primeira explicação, por eliminação via
autoridade inquestionável, um homem pequenino desabafou. “Afinal, qual a sua
função? Ora bolas, que finalidade prática o sujeito garante ao manifestar este
tipo de comportamento? Não me parece uma escolha racional.”
“É claro que não. Agir assim é ingenuidade, conduta de gente
cheia de superstições. Nós não entendemos isto exatamente porque o fenômeno não
pode ser entendido, não é passível de sistematização. Não devemos sujar as mãos
com tal primitivismo.” Concluiu o mais ancião de todos, ignorando o problema
enquanto problema, propondo outras preocupações mais econômico-políticas.
O estudante, aventureiro e antenado com a pós-modernidade escorregadia, arriscou um pensamento abrupto: “há aí uma dimensão
de desejo e afeto, vontade de vínculo, felicidade gratuita no gesto.”
A insatisfação se instalou na roda. A fala reverberou em
inquietação e revolta. Onde já se viu, primeiramente, um reles bolsista sair
proferindo teoria? E, ao fazê-lo, se fundamentar em conceitos tão débeis como
“afeto” e “felicidade”? Mas, tudo bem, esses jovens são mesmo uns sonhadores
desgovernados. Engraçado, até. Um dia eles aprendem.
Vencidos pela fadiga mental, os senhores resolveram –
metodologicamente – encerrar a reunião. Uma cervejinha, pois, que é bom para
relaxar. Rumaram para as mesas amarelas e decidiram mudar de assunto: sessão
científica oficialmente encerrada. Silêncio
improdutivo entre eles. Inesperado feito
borboleta azul, um homem enrugado até então entregue à serena instrospecção, propôs um mote. “Hoje eu li Adélia Prado.” Depois
deu um longo gole e mirou profundamente os olhos do garoto, que
entendeu e não disfarçou o sorriso.